De acordo com um estudo da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), ao menos 44% das mortes de crianças de 0 a 6 anos no Brasil são por doenças evitáveis. Isso significa que o motivo do óbito se deu pela ausência de um atendimento adequado na primeira infância.
Ainda segundo os dados, as causas da morte são por complicações perinatais (pouco antes ou depois do parto) ou doenças respiratórias, infecciosas e parasitárias. Falta de estrutura, ausência de saneamento básico, entre outros cenários, pioram ainda mais a situação.
Segundo a presidente da SBP, Luciana Rodrigues Silva, em entrevista ao Estadão, que divulgou com exclusividade os dados em outubro do ano passado, os resultados do estudo mostram a fragilidade da assistência na atenção primária – sobretudo em relação ao volume alto de internações por doenças respiratórias e relacionadas ao parto.
Silva explica que, se o diagnóstico fosse feito de forma precoce, as crianças poderiam iniciar o tratamento rapidamente ou, então, serem encaminhadas aos centros de maior complexidade.
“É possível perceber a fragilidade da assistência oferecida às crianças e aos adolescentes, que ficam expostos ao risco de doença ou de morte pela falta de acesso aos cuidados especializados”, disse ao jornal.
Atualmente, a maior parte do atendimento na primeira infância é feito por equipes de atenção primária, como as Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou Unidades de Pronto Atendimento (UPA). No entanto, nem todas as UPAs possuem esses especialistas.
Atendimento público vs. privado
Ainda de acordo com o estudo da SBP, apenas 25% das crianças, com melhores condições financeiras, têm acesso a planos de saúde e são atendidas desde o início da vida por pediatras. O restante (75%) usa o Sistema Único de Saúde (SUS) que, geralmente, são atendidos por médicos de família.
Outro dado relevante é que o Brasil tem 43 mil pediatras (ou 20,8 por 100 mil habitantes) – um número considerado alto. No entanto, a distribuição desses especialistas é desigual, já que a maior parte deles está nos grandes centros e na rede privada.
Em 2019, segundo dados do SUS, apenas 1,35 milhão de consultas de puericultura (aquelas consultas realizadas para o acompanhamento do desenvolvimento infantil) no Brasil foram realizadas por um pediatra, representando 0,07% da quantidade necessária na faixa etária de 1 a 6 anos.
Cuidados na primeira infância
A famosa revista científica The Lancet criou, em 2016, uma série denominada de “Advancing Early Childhood Development: from Science to Scale” (na tradução, Avançando no Desenvolvimento da Primeira Infância: da Ciência à Escala).
O programa leva em conta as novas evidências científicas para intervenções, com base nas descobertas e recomendações do periódico e, com isso, sugere caminhos para a implementação de iniciativas que auxiliem na primeira infância, em escala.
A série revela que políticas e programas devidamente financiados durante os primeiros 1.000 dias de vida de uma criança podem ajudar 250 milhões de meninas e meninos em risco. Esse período é crucial, é quando uma criança mais precisa de cuidados na saúde.
Pacto Nacional pela Primeira Infância
É fundamental enfatizar que os primeiros seis anos de vida da criança são muito importantes para desenvolvimento físico, psíquico e pessoal. Por isso, ações de conscientização sobre o tema são mais que necessárias.
No ano passado, inclusive, a SBP assinou o termo de adesão ao Pacto Nacional pela Primeira Infância, que tem o objetivo de fortalecer as instituições públicas voltadas à garantia dos direitos previstos na legislação brasileira para crianças.
Além disso, o pacto visa promover a melhoria da infraestrutura necessária à proteção do interesse da criança, em especial, da primeira infância, e à prevenção da improbidade administrativa dos servidores públicos que têm o dever de aplicar essa legislação.