O preço dos alimentos, em especial produtos básicos como o arroz, causaram espanto nos consumidores e deixaram a compra do supermercado mais cara nos últimos meses. O motivo por trás desse fenômeno é uma velha amiga dos brasileiros: a inflação.
O que é inflação?
A inflação indica o aumento contínuo dos preços de produtos e serviços que consumimos no dia a dia. O cálculo é realizado pelos índices de preços e o indicador oficial do Brasil é o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), do IBGE. Ele é utilizado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão do governo federal, para estabelecer a meta de inflação anual.
Para mensurar se os preços aumentaram ou diminuíram de um mês para outro, o IPCA utiliza uma cesta de produtos e serviços consumidos pelas pessoas. Assim, a taxa de inflação é a variação do custo da cesta.
Entre os itens que compõem a cesta do IPCA estão alimentos e bebidas, transporte, gastos com médico, vestuário, material escolar, cuidados pessoais, moradia, entre outros. No cálculo, o índice considera famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos.
De acordo com Nadja Heiderich, economista e coordenadora do Núcleo de Estudos da Conjuntura Econômica da FECAP, o aumento dos preços tem impacto nas decisões de consumo porque alguns contratos são indexados com base na inflação passada, como aluguel, educação e salário. “Na questão do salário vai influenciar o poder de compra. Quanto maior a inflação, menor o poder de compra do trabalhador, ou seja, menos produtos ele vai adquirir com a sua renda. Para fazer planejamentos é importante acompanhar como os preços estão se comportando”, diz.
Como a inflação afeta o seu bolso?
A inflação oficial brasileira fechou 2020 com alta de 4,52%, acima do centro da meta inflacionária que era de 4%, mas ainda assim dentro do limite de 1,5% para cima ou para baixo estabelecido pelo CMN. Em dezembro, a taxa acelerou para 1,35%, após registrar 0,89% em novembro, segundo dados divulgados pelo IBGE em janeiro.
A alimentação foi a principal responsável pelo crescimento da taxa de inflação brasileira. Em 2020, os preços dos alimentos e bebidas registraram alta de 14,09%, o maior aumento desde 2002 (19,47%).
Entre os itens que tiveram aumento expressivo estão o óleo de soja (103,79%) e o arroz (76,01%). Além da batata-inglesa (67,27%), tomate (52,76%), leite longa vida (26,93%), frutas (25,40%) e carnes (17,97%).
“Devido às medidas de distanciamento social, as pessoas se alimentaram em casa e os produtos in natura tiveram aumento de demanda. Por outro lado, em um primeiro momento, faltou matéria prima para produção até a normalidade ser atingida. Depois a economia reagiu e faltou insumo nos setores que ficaram parados por mais tempo. Também tivemos a questão cambial, com os produtos que compramos fora do país e a elevação do combustível ao longo do ano. Todos esses fatores pressionaram os preços”, afirma Heiderich.
Na prática, o principal impacto do aumento da inflação no bolso do consumidor é a perda do poder de compra, sobretudo para os brasileiros que recebem salário mínimo que passou de R$1.045 para R$1.100 em 2021.
O salário mínimo deve ser reajustado pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do ano anterior, segundo a Constituição. O governo federal, no entanto, fez a correção com base em uma estimativa, visto que o novo valor começa a valer em 1 de janeiro de cada ano e o indicador do IBGE foi divulgado posteriormente.
A correção aplicada pelo governo foi de 5,26%, enquanto o INPC acumulou alta de 5,45% no ano passado. Por consequência, o reajuste do salário mínimo ficou abaixo da inflação.
“Com o aumento do nível geral de preços, as pessoas perdem poder de compra. Se em determinado período elas conseguiam comprar 10 produtos, com o aumento de preços elas vão adquirir 8, 7, 6 itens no final dessa temporada, dependendo da inflação”, explica Heiderich.
A alta da inflação também pode intensificar a instabilidade do mercado e impactar a confiança dos investidores. “O setor produtivo pode reduzir investimentos tanto porque o custo de produção aumenta, quanto pela preocupação de retração de demanda em um cenário inflacionário. A inflação eleva a incerteza de mercado, que reduz os investimentos”, ressalta Luciana Machado, professora de finanças da Fipecafi.
Como controlar a inflação?
A Selic, taxa básica de juros, é a principal ferramenta do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, para controlar a inflação.
Na prática, quando há sinais de elevação do IPCA, o BC aumenta a taxa de juros para esfriar a atividade econômica, conter o gasto e a subida dos preços. Por outro lado, quando a inflação está baixa e controlada, o Banco Central reduz a Selic para estimular a economia, o consumo da população e facilitar a concessão de crédito bancário.
O percentual da taxa de juros é reavaliado e definido a cada 45 dias. Atualmente, a taxa Selic está em 2% e na última reunião do Copom, realizada nos dias 19 e 20 de janeiro, o BC decidiu manter o mesmo patamar. A instituição ainda retirou o forward guidance – orientação futura estabelecida em agosto do ano passado para não aumentar os juros no curto prazo.
Machado acredita que, provavelmente, as autoridades monetárias vão começar a se preocupar com o aumento do custo de vida e a potencial perda de poder aquisitivo em 2021. Também é esperado que o governo federal faça os ajustes fiscais no orçamento e continue as reformas tributária e administrativa para estimular o crescimento econômico no longo prazo.
“Apesar de não adotar imediatamente o aumento das taxas de juros, espera-se que ainda no primeiro semestre de 2021, o BACEN opte por reduzir o estímulo ao consumo por meio da Selic, ou seja, é provável que tenhamos aumento nas taxas de juros em breve”, pondera.
Qual a relação entre inflação e investimentos?
Até aqui já vimos como a variação dos preços pode afetar o poder de compra dos consumidores e a economia de um modo geral. Além disso, a oscilação também impacta a rentabilidade real dos investimentos.
Gabriele Couto, assessora de investimentos da Atrio Investimentos, explica que quando o investidor faz um investimento, seja em renda fixa prefixada ou ações, precisa descontar as taxas e impostos para chegar na rentabilidade líquida. No entanto, esse valor ainda não representa o ganho real.
Para saber o valor real do seu rendimento é necessário descontar a inflação do período. “Pense que você tinha R$ 1.000 para comprar um telefone, mas resolveu investir o dinheiro. Um ano depois você observou um rendimento de 7% e resolveu resgatar o montante no total de R$ 1.070, e ganho nominal de R$ 70. Com o dinheiro em mãos, você vai à loja para comprar o celular, porém agora o mesmo aparelho custa R$ R$ 1.050. Nesse caso, o seu ganho real não foi de R$ 70, mas sim de R$ 20, pois houve uma depreciação no poder de compra do seu dinheiro gerado pela inflação”, explica.
Segundo Couto, todo investidor deve considerar o efeito da inflação nos seus investimentos para saber se o dinheiro está rendendo o valor suficiente para compensar a perda do poder de compra no longo do tempo.
Com a inflação em 4,52%, as aplicações de renda fixa pós-fixadas atrelados à taxa Selic e ao CDI foram as mais afetadas. “No cenário de juros baixos e inflação alta, os ganhos desses ativos não são suficientes para cobrir a desvalorização da moeda, o que gera perda real para o investidor”, diz.
A poupança, por exemplo, rende apenas 70% da Selic e não é um percentual razoável para cobrir os efeitos da inflação em 2020.
Felizmente, o mercado oferece uma gama de investimentos atrelados à inflação na renda fixa e variável, como o Tesouro IPCA, CDBs, debêntures, ETFs (Exchange Traded Funds), fundos imobiliários com contratos de aluguel que acompanham o IPCA ou o IGP-M (Índice Geral de Preços – Mercado).
“Em geral, os ativos indexados à inflação devem sempre ser considerados visando uma maior diversificação da carteira de investimentos. Contudo, em cenários de inflação mais alta e incertezas políticas e econômicas, eles devem desempenhar o papel de proteger o portfólio do investidor contra a desvalorização da moeda, por isso são uma boa opção de investimento nesse momento”, recomenda Couto.
“Na atual conjuntura, marcada pela inflação, temor fiscal e perspectiva de alta nos juros, as incertezas em relação à economia doméstica aumentam e elevam o grau de risco. Por isso, dê preferência aos papéis com vencimento mais curto e prazo médio entre cinco e seis anos. Quanto mais longo o prazo do título, mais sensível ele estará às oscilações do mercado e, portanto, em um cenário desfavorável podem se desvalorizar muito mais”, conclui.