Atentas a tudo, as crianças observam desde muito cedo os conceitos mais elementares sobre o dinheiro, que logo começa a ser citado em seus diálogos e brincadeiras. Para os pais e responsáveis, essas primeiras menções revelam que o aprendizado está sendo construído. Ou seja, é o momento propício para dar início à educação financeira infantil, um processo que vai se estender até a vida adulta.
O primeiro sinal de que já é hora de iniciar a conversa sobre o dinheiro ocorre cada vez mais cedo, por volta de dois anos e meio, explica a psicanalista e educadora financeira, Cássia D’Aquino. “De maneira geral, é quando, pela primeira vez, a criança pede aos pais que comprem alguma coisa para ela”, esclarece.
Autora de uma série de livros sobre o assunto — entre eles, Dinheiro compra tudo? e Como falar de dinheiro com seu filho? —, Cássia afirma que há muitas maneiras de abordar o tema ao longo da infância e da adolescência, em um processo de aprendizagem que deve ser, sobretudo, estimulante.
Da observação à compreensão
O primeiro pedido de compra demonstra que a criança fez uma descoberta muito interessante. “Indica que as crianças já compreenderam o básico em relação ao dinheiro, ou seja, elas já sabem que dinheiro existe, que os pais têm esse tal de dinheiro e que dinheiro dá acesso a coisas divertidas, coloridas e gostosas”, descreve Cássia.
Esse momento emblemático pode ocorrer a partir dos dois anos e meio, fase em que o assunto precisa ser iniciado de forma apropriada, pois a criança não vai compreender conceitos abstratos ou muito complexos. O tema deve ser tratado de forma concreta, argumenta a especialista. “O que se recomenda que seja feito é apresentar para as crianças as moedas”, orienta. É possível evidenciar elementos interessantes, como os dois lados da moeda, símbolos, tamanho e outros detalhes. “São coisas que interessam muito às crianças”, afirma.
“Mais tarde, pode-se apresentar as cédulas, mostrando com uma lupa, por exemplo, os elementos de segurança, que ficam escondidos”, continua Cássia. A criança deve ser orientada sobre a integridade do dinheiro, e que não se deve rasgar, riscar, dobrar ou molhar a cédula. “Tudo isso, de uma maneira concreta, vai ensinando à criança que o uso do dinheiro exige cuidado e atenção, uma espécie de respeito. Isso ela vai carregar para o resto da vida.”
O conceito sobre o que é caro e o que é barato também pode começar a ser trabalhado com crianças pequenas. “Isso se faz de uma maneira muito leve, muito tranquila, numa ida à padaria ou ao supermercado, comentando sobre o que é caro e o que é barato.” Essa é uma maneira de demonstrar para a criança que há uma reflexão que antecede o momento da compra. Vale a pena incluir a criança no planejamento de compras essenciais da casa, solicitando que verifique algum item que precise ser comprado.
Semanada ou mesada?
Dar uma quantia em espécie, periodicamente, é outro caminho para ensinar a criança sobre o uso do dinheiro. Cássia recomenda que esse processo seja iniciado com semanadas, concedidas no mesmo dia da semana e sempre no mesmo valor, acompanhadas de orientação. Os pais devem esclarecer que essa é uma forma de a criança aprender a se organizar em relação ao dinheiro e construir bons hábitos para a vida adulta, como o planejamento financeiro, por exemplo. “É preciso dar explicação à criança, conceder a ela um caderninho onde ela possa ir anotando no que ela está gastando.”
A semanada pode ser iniciada por volta dos seis anos. Cássia detalha que, nessa fase, a criança “está muito propícia à organização e bastante interessada em aprender”. Por isso, é um bom momento para começar. A semanada deve ser mantida até os 10 ou 11 anos, e a partir daí, podem ser iniciadas as mesadas.
No decorrer desse período, os pais devem estar preparados e bem-informados para colaborar no desenvolvimento da criança sobre como usar o dinheiro. “Isso não significa ficar controlando muito de perto e ansiosamente o que a criança está fazendo com o dinheiro. Até porque é de se desejar que a criança cometa bobagens com a grana nessa fase. Exatamente essa experiência é que vai dando a possibilidade de evitar que na vida adulta ela cometa bobagens com muito mais dinheiro e de ordem muito mais grave.”
Cássia avalia que, possivelmente, a criança vai falir em algum momento, talvez até mais de uma vez. “E os pais retomam o processo, para que a criança tenha a chance de compreender onde foi que ela errou.” Uma dica importante é não ficar muito em cima ou agir de forma tirana com o dinheiro da criança.
Lembre-se de que, nessa fase, o dinheiro envolvido é muito pouco e deve ser usado para realizar objetivos de curtíssimo prazo. “Não adianta querer que crianças muito pequenas poupem para a faculdade. Não faz sentido. São projetos de curtíssimo prazo”, reitera. “O que interessa é que a criança seja estimulada a encontrar objetivos para esse dinheiro, que seja levada a alcançar esses objetivos e que se sinta recompensada por isso. Esse processo é que fará dela alguém com uma mentalidade poupadora, porque é alguém que encontra prazer em estabelecer objetivos para o dinheiro, consegue caminhar em direção a esses objetivos e sente prazer em poupar e, eventualmente, em doar.”
Primeiras noções sobre investimento
Conforme a criança cresce, chegando na pré-adolescência e já aprendendo a lidar bem com o dinheiro, é possível avançar um pouco mais e se aprofundar. A introdução ao mundo financeiro deve ser feita de forma gradual, aconselha Cássia. Por isso, é preciso saber dosar a informação de acordo com o nível de maturidade.
“Por volta dos 11 ou 12 anos, a criança já está pronta para visitar o banco, saber como funciona, conhecer o gerente e ter o primeiro investimento, que seja numa caderneta de poupança, que é muito simples”, exemplifica Cássia. “À medida em que vão aprendendo, tudo isso vai ganhando complexidade.”
Os pais que investem em previdência privada para os filhos, com o tempo, podem trazer esse assunto e explicar como funciona esse investimento, mas tão importante quanto isso é advertir que esse é um assunto reservado à família, que não deve circular entre outras pessoas. Cássia frisa, ainda, que a previdência deve ser apresentada como esforço positivo e não como um sacrifício oneroso e que os pais devem planejar, antes, a própria previdência.